Saltar para: Posts [1], Pesquisa e Arquivos [2]
É Domingo.
De novo começa a semana, já sem Maio bastante para a preencher. Esgota-se o tempo, sem que se cumpra a promessa de água.
Depois da missa, o adro está coberto por um dossel de veludo cristal estofado nas nuvens, que rangem e roncam antes de estourar como foguetes. Nem um borrifo que chegue das alturas, para acamar o pó solto nas corridas das crianças ao sair da igreja. Dizia o pai de Isabel, por ter ouvido no sermão, que chuva em Maio é sinal de boas águas. Estaria a saudar a chegada do Inverno noutras paragens, e nós por cá caminhamos para um sempre Verão. A luz densa, coada pelo chumbo de ameaça líquida, é sinal, mas só sinal, sem águas, nem sermão. Falta água e dessa falta se inquieta o futuro, nas conversas saturadas do opressivo calor. Queixam-se vozes arrastadas em gargantas secas, das cefaleias presentes, trazidas pelo insustentável peso do ar. Da pressão, da carga elétrica, da enorme consumição de não ter água, se lamentam.
Abeira-se à porta o prior, para despedir os fiéis na cerimónia do envio ao almoço dominical. O céu torna a rugir e do alto respinga uma gota gorda. Escorrega duvidosa na testa, talvez um bago de suor. E logo outra, e outra, e outra a fazer diluir as gentes estagnadas no adro. Almas penadas e pingadas, à procura de abrigo, por ter chegado a bendita água. Água sólida e redonda, vinda do céu. Sem demora, se vai maldizer o chuveiro de berlindes.
Assim é o Domingo.
A subscrição é anónima e gera, no máximo, um e-mail por dia.