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Chega o outono, já lá vem outubro, tempo de começar.
Se for linda, quase de certeza que é boa. No primeiro dia, tinha muito medo que ela fosse má, como a D.ª Celeste que ralha e bate, por ser feia. Ela põe as meninas dela de castigo, viradas para a parede com os joelhos no chão e manda fazer cópias durante o intervalo, sem lanchar. Quando chama burra e estúpida, fala muito alto, para se ouvir na escola toda e deixar as meninas envergonhadas e a chorar. A D.ª Celeste é má e feia, mas tão feia, que nem as contínuas gostam dela. A minha professora não é assim, fala baixo e com voz rouca por causa da alergia ao pó do giz, e porque é boa. Eu tinha medo, mas vi logo que era boa no primeiro dia. Depois de fazer a chamada, disse que nós todas juntas éramos os seus pintainhos. E não foi só isso, ela mandou guardar a régua de madeira na caixa métrica. Eu ainda não sabia o que era a caixa métrica, que estava ao fundo da sala por baixo dos mapas das terras e do corpo por dentro. Ao lado do quadro estava um esqueleto que assustava e por cima havia o crucifixo e os retratos de uns senhores muito sérios, sempre a olhar para nós, que assustavam ainda mais. Essas coisas ela não mandou guardar, mas pensei que a minha professora era boa, só por não querer a régua para bater. Olhei para ela e vi que era linda, parecia uma mãe com bata branca. Nós também temos bata branca, mas as batas das meninas apertam atrás com botões e com um laço e a bata das professoras tem os botões à frente e ao meio. A bata dos rapazes também aperta à frente, mas de lado e nesta escola não há rapazes. Têm uma escola só para eles. O avô conta que a escola dos rapazes foi feita para todos, quando era no tempo dele. O pai diz que não se pode deixar torto aquilo que nasceu direito e que está mais que na hora de fazer as coisas mudarem. O avô manda-o falar baixo, porque as paredes têm ouvidos e o pai não se cala e mete-se em trabalhos muito maiores do que a escola, que fazem a mãe ficar aflita. Eles falam e às vezes discutem, eu presto muita atenção, mas nunca os ouvi dizer nada sobre a maneira como as batas apertam. A minha é branca, muito branca e sem quadrados como o bibe, Foi a minha avó, quem a fez a bata. Ela sabe costurar e fazer muitas outras coisas, mas não sabe ler. O avô ensinou-a a desenhar o nome para não ter que pôr uma cruz em vez do nome, e eu vou ensinar-lhe a escrever o resto. É por isso que ela quer muito que eu vá à escola. Também tenho outra avó, que vive longe com o outro avô. Mandou-me um casaquinho branco para pôr por cima da bata quando estiver frio. Foi ela que o fez, com um novelo de lã, porque sabe tricotar e também sabe ler e escrever. Aprendeu com os professores que iam a casa e depois fez um exame e foi para o colégio. A ela não posso ensinar, mas vou-lhe escrever muitas cartas a contar o que aprendi. Ainda bem que a minha professora é linda!
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